sábado, 9 de abril de 2011

Marginalidade como aspecto tradicional.

Há algum tempo venho lendo e ouvindo diversas pessoas falando bobagens sobre o significado do aspecto marginal das bruxas, coisa sempre lembrada por aqueles que seguem o caminho, mas deturpada por aqueles que acham que seguem. Entre essas pessoas alguns são os que gostam de falar do que não conhecem, mas outros realmente não conseguem compreender tal questão e acabam por repetir falácias a respeito, porém, sem tal intenção. A estes últimos que dedico meus comentários.

Primeiro precisamos desconstruir um senso comum, ou seja, precisamos eliminar da mente uma conceituação social que nos leva ao erro quanto ao entendimento real de uma expressão e seu significado. Trabalho hercúleo, eu sei, mas que vale a pena ser feito. Por razões culturais, principalmente ligadas a questões políticas e econômicas a "margem" de uma cidade sempre foi considerada a área mais pobre, rústica, selvagem. Com o passar do tempo o selvagem, ou o "não civilizado" tornou-se um bode expiatório para as mazelas sociais, o marginal tornou-se sinônimo de bandido.

A idéia de marginal não tem relação única com a construção do espaço geográfico de uma cidade, mas, acima de tudo, com uma ideologia onde a marginalidade - a periferia; se contrapõe a ordem social - o centro. O marginal é ‘perigoso’ porque na visão de quem constrói o ordenamento urbano ele representa o transgressor da ordem imposta, aquele que se coloca não apenas fora como contrário a ela.

Assim os sacerdotes - organismos que legitimam o poder centralizador -, se contrapõem às bruxas – organismos que transgridem as normas em prol da liberdade -, é nesse jogo de cão e gato que se cria o folclore das bruxas corcundas e más, que vivem em um chalé assombrado na mata, enquanto os sacerdotes são aqueles dotados de bondade que habitam os templos cultuando os deuses. Para os povos antigos o “mundo” que existia fora dos muros da urbes era selvagem, desconhecido, regido por monstros e pelo caos. (Leiam a epopéia de Gilgamesh para compreender isso melhor), é por esse motivo que as bruxas eram retratadas dessa maneira, seus poderes vinham desse caos, desse mundo desconhecido, seus espíritos eram os monstros que vagavam nas sombras do mundo além.

O que existe de real dentro desse imaginário popular? Porque ainda hoje as bruxas são tidas como marginais?

Há um aspecto perene na bruxaria: a arte sábia se manifesta nos espíritos indomados, naqueles que não se submetem ao julgo externo, não institucionalizam seu saber,  reconhecem a beleza na monstruosidade do caos, não domesticam sua fera interior, não limitam sua liberdade, enfim, bruxas são plenas em si mesmas e, portanto, não deixam na mão de outros o seu poder.

Isso significa que bruxas são pessoas malucas, imorais e que não respeitam as leis? Não, significa que bruxas são amorais (busquem o significado da palavra), significa que elas são tão sóbrias que se permitem a insanidade em alguns momentos, significa que elas seguem as leis que acreditam ser preciso seguir, pois, qualquer transgressão é feita conscientemente, com responsabilidade e a capacidade de assumir seus próprios atos. E por serem tão livres, por não serem ovelhas é que ao estarem na beira do círculo elas podem enxergar o que acontece dentro, saber o que acontece fora e decidir por si mesmas, de olhos bem abertos.

Bruxas vivem entre a benção e a maldição, mas sua honra, valor e amor pelo sagrado são incontestáveis, pois elas não fazem o que fazem porque outros disseram para fazer, elas escolhem cada gesto, elas assumem cada olhar, elas encantam a alma e a fazem dançar.

6 comentários:

  1. Incrivel! Parabens Agatho!
    Vou replicar no Ophidicus!

    =)

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  2. Realmente,é essa linguagem esclarecedora que estava faltando...Parabéns...

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  3. Agatho, disse tudo! Parabéns pela beleza e Verdade nas palavras.

    Blessings and hugs.

    Odir.

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  4. Um texto mais lindo do que o outro! Parabéns!!!
    Vou postar este logo logo...kkk (dando um espaço para digestão)

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